Especial: Radiohead no Brasil [#6]


Radiohead honra o mito em São Paulo
[Por Marcelo Costa para o site Scream & Yell]

“Adivinha o que nós vamos tocar?”, diz Thom Yorke rindo com jeito de menino que está prestes a fazer uma traquinagem. O segundo show brasileiro da In Rainbows Tour caminha para 2h20 de duração e a banda está voltando animadíssima para o terceiro bis (!!!). Ele está de camiseta preta e é igualzinho às fotos que marcaram o imaginário popular durante os últimos 15 anos, um misto de nerd e gênio cujo dom maior (talvez mais do que compor) é ter uma voz tão lírica que poderia fazer um comediante chorar copiosamente no meio de uma piada.

Até este momento, o show já tinha conquistado os corações das 30 mil pessoas que, ao contrário do Rio de Janeiro na sexta-feira, não deram no pé quando o Los Hermanos encerrou sua apresentação na abertura da noite. Os Hermanos, aliás, fizeram um show aquém de seu potencial. Amarante, entre rouco e/ou bêbado, enrolava-se nas silabas sem se fazer entender (e olha que muitos presentes já sabiam as canções de cor). Camelo, mais animado, conduziu o bloco disperso cujo carnaval só pegou fogo nos últimos dez minutos com os hits “Último Romance”, “Sentimental” e “A Flor”. Um show morno que privilegiou as pálidas canções do controverso álbum “4″ e até fez sentir saudade da turnê do “Bloco”. Descansem em paz.



Na seqüência, o Kraftwerk – apenas com Ralf Hütter da formação original – surgiu para contar a história da música eletrônica. Está tudo ali, de New Order a Chemical Brothers passando por Afrika Bambaataa e chegando ao funk carioca. Quem viu alguma das passagens anteriores da lenda pelo país (em 1998 e 2004), assistiu ao mesmo show e achou repetitivo. Quem nunca tinha visto, agradeceu ao céu estrelado e dançou hinos eletrônicos do quilate de “Computer World”, “Autobahn”, “Radio-Activity”, “Tour de France” e “Trans Europe Express”. Ok, eles devem ficar no MSN enquanto as batidas pré-gravadas fazem a sua parte, e nem disfarçam isso quando colocam robôs em seus lugares, mas são História com H maiúsculo. É preciso curvar-se.



As 22h em ponto soltaram a base minimalista que antecipa a entrada do Radiohead no palco. Começaram com “15 Step” (como em mais de metade das 50 apresentações anteriores desta turnê) e emendaram logo com a batida tribal da matadora “There There” em versão chapante. Como previsto anteriormente aqui, a primeira parte do show variou músicas de “Ok Computer” (”Karma Police”), “Kid A” (”Optimistic” e a estupenda “National Anthem” com Jonny Greenwood sintonizando rádios paulistas na introdução), “Amnesiac” (”Pyramid Song”), “Hail To The Thief” (”The Gloaming”), b-sides (a excelente Talk Show Host”) e “In Rainbows” (”Nude”, “All I Need”, “Weird Fishes/Arpeggi”, “Faust Arp”).

Em comparação com os shows de Leuven e Berlim, a apresentação de São Paulo pulava à frente a da cidade belga e igualava-se em emoção ao show da capital alemã, que levou milhares de pessoas às lágrimas na dobradinha “No Surprises”/”My Iron Lung”. Porém, a capital paulista começou a tomar a dianteira com uma versão arrasadora de “Jigsaw Falling Into Place”, passou brilhando por “Idioteque” (costumamente um dos pontos altos do show) e caiu no colo da dobradinha “Climbing Up The Walls”/”Exit Music (For A Film)”, dois hinos secundários de “Ok Computer” cuja junção lírica fez encher os olhos. “Bodysnatchers”, a porrada de “In Rainbows”, fechou o show de forma digna.

A banda retornou para o (primeiro) bis com a baladaça “Videotape”, então os céus se abriram para “Paranoid Android”, um dos pontos altos de toda carreira do Radiohead. Ao final da canção, porém, o inusitado aconteceu. O público continuou fazendo a segunda voz (que na música é de Ed O’Brien) mesmo com a canção terminada, e Thom Yorke entrou no clima: pegou o violão e voltou a fazer a primeira voz entrelaçando-se com a platéia num daqueles momentos raros que valem uma vida. Emendou “Fake Plastic Trees” e todas as dúvidas se dissiparam antes mesmo do fim do primeiro bis: São Paulo estava assistindo à provável melhor apresentação do Radiohead nos últimos anos.



O primeiro bis seguiu-se emocional com “Lucky” e “Reckoner”, momento em que a banda deixou o palco para desespero da turma do gargarejo, que sozinha gritou por todo o público, meio que esperando o inevitável, que veio na forma de um segundo bis. “House of Cards” abriu o segundo encore seguida por “You and Whose Army” (em grande versão) e “Everything In Its Right Place” em versão electro (precedida por uma citação de “True Love Waits”). Acabou. Acabou? Não. É neste momento que a banda retorna para o terceiro bis e Thom, brincalhão, provoca a platéia. “Adivinha o que nós vamos tocar?”, ele diz ao microfone. Segundos depois, “Creep”. E ponto final. Uma apresentação digna da grandiosidade do mito.

Do ponto de vista de produção, o Just a Fest foi um dos eventos mais vergonhosos realizados em São Paulo nos últimos anos. Os relatos sobre problemas da organização da Plan Music foram postados aqui por diversos leitores, e quase estragaram a festa de milhares de fãs. Felizmente, do outro lado da moeda, o Radiohead cumpriu o esperado com uma apresentação arrebatadora. É preciso estar ciente, porém, que um bom show não salva um evento. Muita gente diz que passaria a mesma coisa para ver o Radiohead, o que mostra o quanto o público brasileiro é despreparado no quesito “direitos”: ele está pagando, mas mesmo assim aceita ser insultado. Não deve, e o Ministério Público pode ser acionado (como alguns fizeram) em caso de abuso por parte do realizador, pois a lembrança de um show tem que ser da arte feita no palco, e não da desorganização de um bando de incompetentes. Que o show do Radiohead fique na memória. O resto…


Fotos: Marcos Hermes / Divulgação

Links: radiohead.commyspaceokradiohead

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