Azevedo Silva - Autista (2008)

Era uma vez — e é assim que começam todas as boas histórias. Autista, segundo disco de Azevedo Silva, é um exercício de tristeza, isolamento e quase solidão. É a ironia da percepção de quem vive num mundo próprio rodeado de gente, porque afinal somos todos um pouco assim: autistas. Neste universo – paralelo, pois claro! — a realidade é um acto demasiado consciente. O mundo é ensaiado numa guitarra acústica e outra amplificada, onde as faixas versam sobre personagens de amor e ódio.

É fácil assegurar que Autista se segue a Tartaruga, o primeiro, não pela vulgar maturidade, antes pela — e é diferente — perda de ingenuidade. Se Tartaruga andou à deriva por este mundo fora, Autista faz-nos parecer que conhece o caminho: é mais intenso, mais pesado e mais envolvente. Adulto, diria. Este cancioneiro não será, por isso, amor à primeira vista, nem amor que se sabe para a vida, — ou a morte —, inteira. É possível consolidar a premissa após repetidas audições, de olhos fechados, sem interlúdio.

Canta-se com a alma de outros tempos, a de sempre. A pena faz parte do seu timbre, do tom de quem é um contador de histórias, de barba feita, mas sem rugas, sentado numa esquina qualquer. Os transeuntes jamais terão a percepção exacta daquilo que é ou daquilo que canta — um pobre diabo? A atitude é claramente dicotómica, entre a auto-exclusão por opção em “sabe a pouco o que a vida nos reservou”; e a exclusão forçada que resulta num lamento desolado e descrente: “alguém que pare o mundo que eu quero sair”. Talvez em Autista, tenha criado um mundo só seu, onde é mais difícil entrar. Há que saltar o muro.

Azevedo Silva regressa. Azevedo Silva veio para ficar, percebe-se. Há que ter em conta as edições anuais que nos tem oferecido. As influências continuam em Zeca Afonso, sem preconceitos, com humildade e, sobretudo, atitude. Autista é despido e despojado. Os arranjos são, a par da beleza, subliminares. A simplicidade nada fica a dever à intensidade das canções que se fazem ouvir. Aqui a guitarra continua a ser o melhor instrumento para dar forma às vozes que dentro de si, sem rasto, querem sair. E saem mesmo.

Azevedo Silva
Autista
2008

1. Era Uma Vez
2. De Olhos Fechados
3. A Morte
4. Um Pobre Diabo
5. Interlúdio
6. Pena
7. Rugas
8. À Deriva
9. Die Mauer
10. Sem Rasto

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2 comentários:

Anônimo disse...

achei muito interessante o que li e baixei o disco.Estou ouvindo a faixa 5 no momento e já estou apaixonado por ele.Muito bonito.Recomendadissimo.
Pena que não achei as letras em lugar nenhum...alguém sabe onde tem?

parabéns pelo maravilhoso blog.Esse é um dos principais lugares onde vou procurar música pq sempre encontro coisas de artistas que já gosto além de ficar conhecendo tantos outros.Delícia!!

Anônimo disse...

Ainda passas por aí?
Se sim, responde qualquer coisa para o. azevedo . silva . [at] gmail.com