Erasmo "Rock 'N' Roll" Carlos

Erasmo "Rock 'N' Roll" Carlos
Por Rita Lee

Rock não é coisa para maricas. Erasmo está aí que não me deixa mentir. Ao ouvir esse último trabalho imagino o “gentle giant” cantando no palco vestido de couro preto da cabeça aos pés enquanto marca o beat da música com a mão na coxa. Desde Marlon Brando e James Dean sou chegada num bad boy. Erasmo era o bad boy da Jovem Guarda, o que para mim significa ser ele o verdadeiro pai do rock brasileiro. E no meio dos trocentos clones que poluem as atuais paradas de sucesso com suas mesmices, eis que nosso Tiranossaurus Rex abre alas só com inéditas.

As músicas são a simplicidade com trombetas. As letras o pretinho básico com diamantes. O backing vocal um coral de anjos infernais. Os instrumentos e os arranjos são pérolas do bom gosto (rola até um Farfisa e um Hammond no meio de modernidades sonoras). E toda essa farra pilotada pela produção de Merlin Liminha. Graças aos deuses Erasmo é Erasmo, uma sacação genial se dizer cover de si mesmo no meio dos Elvis, Robertos, Rauls e Beatles, seus roqueiros porretas.

Você vai ouvir um macho apaixonado pelas fêmeas do planeta sem o menor pudor. Entre mulheres melancias, samambaias, melões e jacas, só Erasmo para proclamar aos quatro ventos que a mulher é uma guitarra.E rola de tudo no salão. Melodias lacrimejantes, harmonias delicadas, rocks gaiatos, baladas românticas, declarações rasgadas, deboches safados, conselhos para dor de cotovelo, guitarras sutis, baixos esquisitões, enfim: Erasmo Rock'n'Roll Carlos me deu uma baita inveja da leveza com que ele conduz seu barquinho por entre as tempestades e calmarias da vida. Erasmo, cadê você? Eu vim aqui só pra te ver!


Aumenta que isso aí é Erasmo Carlos
Por Jamari França

Erasmo Carlos é o ícone maior do rock brasileiro. Não importa a geração de músicos de rock, se ouvirem a pergunta sobre quem é o maior, quem é o cara e a cara do rock brasileiro vai dar o Tremendão com certeza. E agora ele finalmente atende aos que pediram durante anos que gravasse um disco de rock.

"Rock'n'Roll" é tudo que a gente sempre esperou dele. Rock básico, no talo, sessentista, com romantismo e humor, as características básicas da obra dele: - Eu era muito cobrado pelos fãs que encontrava na estrada e me davam esporro, dizendo que estava usando muito teclado e pediam as guitarras. E eu também cobrava isso de mim mesmo. Tudo aquilo ia ficando na cabeça até que a hora se apresentou de fazer o disco, conta Erasmo, que nos últimos dois anos acumulou uma leva muito boa de músicas.

Para formatar musicalmente o disco, ele escolheu o produtor Liminha, que não precisa de apresentações: - Começamos a trabalhar eu no violão, ele e uma bateria eletrônica, Ele seguiu todas as minhas levadas tanto na ordem como na construção das músicas. Seguiu tudo à risca. Acho que foi a primeira vez na minha vida que isso aconteceu. Erasmo diz que é fiel às suas raízes e não procura fugir delas. Define-se como um músico intuitivo que não se esquiva de dizer que segue os caminhos de sempre. Quando se lê atualmente sobre novas bandas, o que mais se vê é que se inspiram nos anos 60, o que só revalida os caminhos de Erasmo, um dos autores da cartilha do Rock Brasil.

No disco, Liminha joga nas 11. Além de produzir toca guitarra, baixo, ukelele. Dadi toca guitarra e baixo, Cesinha está na bateria e Alex Veley nos teclados. Pedro Dias e Luiz Lopez, da banda Filhos de Judith, fazem os vocais. Essa é a banda básica, mas tem alguns convidados que cito nas canções de que participam. "Rock'n'Roll" tem cinco músicas do próprio Erasmo e duas cada com os parceiros Nando Reis, Chico Amaral e Nelson Motta. E uma com Liminha. Vamos a elas.

Jogo Sujo (Erasmo) - Esse rock fala das rasteiras que a vida dá na gente e também do contrário. Liminha pilota as várias guitarras que colorem os dois canais, incluindo uma guitarra barítono que faz algo parecido com o riff de Last Time, dos Rolling Stones. O solo de guitarra evoca alguma coisa na linha de Johnny Winter, básico e certeiro. Erasmo recorreu a metáforas do jogo de cartas para dar o recado: "Com a dama escondida na manga/ O mundo me chamou pra jogar/ Vítima de tal esperteza/ Pus a vida na mesa e resolvi topar/ Apostei no risco/ Paguei e não vi/ Morri na praia/ E além de morrer sofri".

Cover (Erasmo) - Erasmo conta que nas suas andanças pelos Brasis, ele sempre topava com covers de Roberto Carlos, Raul Seixas, Michael Jackson, Beatles, Elvis Presley e outros, mas nunca viu um cover dele mesmo. Daí se inspirou para fazer essa brincadeira. Lá nos créditos ele até colocou esta dedicatória: "Ofereço este disco ao meu cover... Que sou eu mesmo". A introdução é puro blues de raiz que se transforma num rock para ele contar a história: "Sou um cover que imito até o meu autógrafo/ Diferente de tantos de norte a sul/ Covers de Roberto ou de Elvis/ Michael Jackson, Beatles e Raul".

Chuva Ácida (Erasmo e Nelson Motta) - Nelson é um conhecido das antigas, mas esta é a primeira vez que rola parcerias com Erasmo. Esta balada folk falava em Chuva Fina, mas Erasmo resolveu dar um toque ecológico e a transformou em Chuva Ácida como pano de fundo para a letra romântica sobre um fim de amor: "Chuva ácida/ Dia frio sem sol/ Nossa história/ Chega ao fim do fim."

Olhar De Mangá (Erasmo) - Erasmo fez esta letra inspirado nos filmes e quadrinhos japoneses em que os personagens tem olhos grandes, que ele usou aqui com a imagem dos olhos de conquista. E, nesse clima, cita mulheres de várias épocas e afazeres, todas com olhos de pidona. Balada meio blues com uma guitarra distorcida e cama de órgão. Até dei um toque que algumas podiam não gostar desses "olhos de pidona," mas ele disse que foi o que pintou e ficou. Saquem só os versos: "E lá em cima/ No jardim do éden/ Os deuses já de porre/ Brindam com maná/ A grande sacanagem na terra/ Tudo por causa do olhar de mangá."

Noite Perfeita (Uma Farra no Tempo) (Erasmo e Chico Amaral) - Erasmo conheceu Chico Amaral através do empresário do Skank, Fernando Furtado. O Skank participou da segunda edição de "Erasmo Carlos convida" (2007) e os dois se apresentaram no projeto Loucos por Música. Erasmo achou essa letra de Chico Amaral um achado: - É uma compilação de noites de qualquer geração, uma noite com tudo que aconteceu em várias noites ao som de rock'n'roll. Um trecho: "Era no batente a vida/ Na batida do rock n'roll/ Era como agora/ Noite sem aurora/ E o diabo ao redor." Dom Liminha colocou duas guitarras em timbres opostos para fazer a levada, a mais aguda com um timbre que lembra a Rickenbacker de 12 cordas de Roger McGuinn, dos Byrds. O coral é bem Lennon e McCartney nas vozes de Pedro e Luiz, que entusiasmaram Erasmo com o trabalho vocal que fizeram em várias faixas do disco. Na bateria, uma surpresa: Gil Eduardo (filho de Erasmo) conduz a farra!

A Guitarra É Uma Mulher (Erasmo e Chico Amaral) - Erasmo adorou esta letra de Chico Amaral, a junção de imagens poéticas sobre a guitarra e a mulher, o instrumento e a musa inspiradora: "Muitos irão tocar as cordas da beleza/ E com certeza a mesma fome de amor/ Tantos virão que nem você num breve instante/ E deixarão uma canção nascer/ Pra que tudo seja uma ilusão." A levada tem guitarras em diversos timbres, cama de órgão e uma batida marcada bem ao estilo do rock sulista americano à brasileira, claro.Os solos são de Billy Brandão.

Um Beijo É Um Tiro (Erasmo e Nando Reis) – Erasmo gravou com Nando Reis na coletânea Cidade do Samba há tempos e os dois sempre falavam em fazer alguma coisa juntos. Erasmo solicitou quando Nando estava trabalhando num disco seu e foi atendido, o que o deixou feliz e honrado. Nesta letra, Nando compara o beijo a um tiro e Erasmo assina embaixo: - Foi o que ele imaginou. A inspiração do poeta não se discute – diz Erasmo. A imagem aqui associa o tiro a um instrumento de conquista, tiro certeiro com uma levada rock com guitarras multiplicadas: "O beijo é como um tiro/ Miro e desfiro/ A pele ele não fere/ É um corte invisível."

Vozes Da Solidão (Erasmo) - Erasmo diz que esta letra é bem pessoal, uma referência a tempos sombrios que ele conseguiu superar, de solidão e desamor: "Quando meu tempo negro/ Tornou-se claro/ E fez-se luz/ Dissolveu-se o fardo/Que me pesava como uma cruz". A levada é lenta e o arranjo bem climático com guitarras e teclados.

Mar Vermelho (Erasmo e Nando Reis) - O mar em chamas da letra de Nando ganha um arranjo cheio de ruídos, uma batida poderosa de João Barone e uma levada com guitarra distorcida que reforçam a mensagem um tanto apocalítica do mar e do ar em chamas num dia que não vai acabar: "E quem não saiu agora saia/ Cai na farra quem nunca caiu/ Quem nunca sorriu hoje gargalha/e sonha quem o olho abriu."

Noturno Carioca (Erasmo e Nelson Motta) - Erasmo diz que esta letra o levou a imaginar que Nelson Motta a concebeu da janela de seu apartamento à beira-mar em Ipanema. Uma balada sobre estar a sós com a pessoa certa numa noite qualquer. A levada com dois ukelelê tocados por Liminha e Dadi dá um tom havaiano, colorido por uma guitarra tremolo."As luzes dos barcos à noite/ São como estrelas no mar/ Vistas do alto e de longe/ É um céu sem luar."

Encontro Às Escuras (Erasmo) - Essa parece refletir algo da era da internet, mas Erasmo disse que isso já rolava há muito tempo pelo telefone. Ele mesmo diz que já embarcou numas boas e numas furadas nos velhos tempos só na base do telefone. A letra tem o bom humor característico numa levada leve de rock'n'roll.

Celebridade (Erasmo, Liminha e Patrícia Travassos) - Esta nasceu no estúdio com Erasmo botando pilha para que Liminha fizesse a letra. Ele relutou, mas acabou saindo com essa pérola sobre uma mulher que a gente vê muito hoje em dia. Aquela que faz tudo para ser uma celebridade tendo como arma seu corpo (e uma ajudinha do photoshop). A letra tem como narrador um cara que entrou na roubada de se apaixonar pela figura. Os dois últimos versos são especialmente certeiros: "Se ela vacilar na mídia/ Vai acabar dançando o creu." A levada reggae/calypso evoca um velho sucesso dos anos 60 chamado "Shame and scandal in the family". João Barone toca bateria e comparecem os sopros paralamicos de Monteiro Jr. (sax tenor) e Bidu (trombone) mais Jéferson Vistor (trumpete).

É isso, aumenta que isso aí é rock'n'roll, um disco para se ouvir em alto e bom som do verdadeiro rei do Rock do Brasil.


Eis a capa e o tracklist:

Erasmo Carlos
Rock 'N' Roll
(2009)

01. Jogo Sujo
02. Cover
03. Chuva Ácida
04. Olhar de Mangá
05. Noite Perfeita (Uma Farra no Tempo)
06. A Guitarra é uma Mulher
07. Um Beijo é um Tiro
08. Vozes da Solidão
09. Mar Vermelho
10. Noturno Carioca
11. Encontro às Escuras
12. Celebridade


Links: erasmocarlos.com.br | myspace | coqueiroverde


CDs & MP3s:
BuscaPé
MercadoLivre
Submarino
Amazon
CD Universe
Insound
7digital

2 comentários:

criiis. disse...

adorei a descrição da Rita lee ;]

Erasmo Carlos disse...

Os links para as músicas, que vinham direto do myspace, deram pau, ao menos temporariamente.

Mas aqui tem o álbum completo:

http://rapidshare.com/files/243014723/erasmo_carlos_rocknroll.rar