1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer

Autor de 1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer esquece do rock brasileiro, mas dá destaque à MPB... e diz "Quero saber mais sobre Raul Seixas"
[por Jotabê Medeiros]

Paixão dos anglofalantes, as listas de melhores sempre dão o que falar - geralmente para o mal. Mas listas de fôlego, pela abrangência, têm menor chance de ser alvo da maledicência.

É o caso desse novo livro 1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer (Sextante , R$ 45,50, 960 páginas), um baita compêndio editado por Robert Dimery. O volume compila os discos considerados mais relevantes por 90 jornalistas e críticos de música (primordialmente do Hemisfério Norte).

O organizador fez um grande esforço mundializante, tentando enxergar além de seu umbigo (isso não era comum até pouco tempo atrás). O resultado ilustra que nunca se assumiu com tanta ênfase o quanto a música brasileira foi e é influente. 'Eu vou procurar saber mais sobre Raul Seixas', prometeu Robert Dimery, em entrevista ao Estado por e-mail, esta semana.

Um respeitável número de discos brasileiros engrossa a lista final: Francis Albert Sinatra & Tom Jobim (1967), Beach Samba (Astrud Gilberto, 1967), João Gilberto & Stan Getz (ambos, 1963), Caetano Veloso (Caetano Veloso, 1968), Mutantes (1968), Clube da Esquina (Milton & Lô Borges, 1972), Construção (Chico Buarque, 1971), Ogum Xangô (Gil & Jorge Benjor, 1975), África Brasil (Jorge Ben, 1976), Gravado ao Vivo no Canecão (Tom/Vinicius/Toquinho/Miúcha, 1977), Vento de Maio (Elis Regina, 1978).

Quase tudo entre os anos 1960 e 1970. Nos anos 1990, ressurge Caetano Veloso, com Circuladô (1991); o Sepultura comparece com Arise (1991) e Roots (1996); um outsider, o iugoslavo Suba (que viveu em São Paulo e morreu num incêndio), consegue a proeza de emplacar seu único disco, São Paulo Confessions (1999). E a filha de João Gilberto, Bebel, marca o início do século com Tanto Tempo (2000). Os baianos, de fato, não são fracos: a irmã de Caetano, Maria Bethânia, emplacou Âmbar (1996), mesmo ano de Alfagamabetizado (Carlinhos Brown), também na lista.

Artistas das outras constelações entraram na lista: Piazzolla, Baaba Maal, Madredeus, Tom Waits, Zappa, Buena Vista, Youssou N'Dour. Obviamente, o leitor vai dar pela falta de muita gente, como Tom Zé, Secos & Molhados, Raul Seixas. Mas o fato é que os ingleses e os americanos, de uns 10 anos para cá, começaram a incluir nos seus créditos teóricos o peso da música do Brasil na produção internacional. No jornal The Guardian, no dia 23 de agosto, Alexis Petridis fez um longo artigo sobre a criatividade da música brasileira dos anos da ditadura.

O volume 1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer não é um livro inútil. Só pelo levantamento historiográfico (as fichas técnicas dos discos, as fotos de capa, as listas de músicas, mais de 900 imagens) já seria uma respeitável fonte de referência.

Você acredita que sua pesquisa para 1001 Discos é um tipo de trabalho de historiador? Você tem esse tipo de ambição? Ou é apenas um ponto de vista jornalístico? Você procura também um sentido musical?

Bem, não posso reivindicar ser um historiador musical, tenho medo! Você levantou um ponto interessante. Nossa ambição original era simplesmente juntar 1001 discos significativos ou influentes de um abrangente leque de gêneros musicais dos últimos 50 anos. Alguns foram grandes hits; outros atravessaram completamente o planeta quando foram lançados. Mas, ao fazer isso, inevitavelmente nós criamos um livro que habilita o leitor a traçar uma história da música pop em todas suas formas gloriosas, de Sinatra nos anos 50 aos White Stripes hoje. Primeiramente, sou um fã de música. Como editor do livro 1001 Discos, eu procurei difundir a palavra sobre a boa música que eu gosto e procurei achar música nova que eu poderia ajudar a difundir uma palavra a respeito.

Há discos muito vanguardísticos e experimentais no seu livro, e também discos mais comerciais, como Justin Timberlake e outros. Após todas as escolhas de críticos e jornalistas, você teve alguma responsabilidade no balanço final?

Fico feliz que tenha mencionado que há um monte de discos experimentais no meu livro. Garimpei a lista inicial de 1001 discos com um tornado criativo que atende pelo nome de Tristan de Lancey (ele é autor do design do livro, e eu acho que fez um trabalho fantástico). Agora, há certos discos que você simplesmente tinha de colocar lá, as pessoas ficariam um pouco chateadas se não os vissem lá - Revolver, dos Beatles; Getz/Gilberto; Justified do Justin Timberlake; CrazySexyCool, do TLC, por exemplo. Grandes hits. Mas queríamos ter algo 'deixado para trás' na lista também. Foi, definitivamente, uma decisão política. Às vezes eram os jornalistas que nos sugeriam 'clássicos perdidos', às vezes Tristan e eu é que sugeríamos algum. Acho que, sim, eu tive a palavra final no equilíbrio da lista.

Para muita gente, com a chegada da nova era da internet, MP3, iPods e badulaques eletrônicos para ouvir e fazer música, a noção de álbum está em xeque-mate. Qual sua opinião sobre isso?

Boa questão. É claro, agora que as pessoas podem baixar faixas individuais de um álbum de forma tão barata, a idéia de um disco como uma seleção de faixas juntadas deliberadamente por um artista pode ser... quadrada e fora de moda. O álbum tem um futuro? Eu acho que sim, acho que haverá sempre gente suficiente que queira o pacote musical inteiro que um álbum te dá, mais do que faixas individuais. Mas eu só estou falando aqui por causa da música. Uma das glórias de alguns dos elepês sobre os quais você vai ler em 1001 Discos é o trabalho de arte que vem com eles. Pense na capa no primeiro disco de Elvis, no Ziggy Stardust de Bowie ou mesmo em Dummy, do Portishead. É uma das grandes responsáveis pela forma como os álbuns 'funcionaram' historicamente - os fãs devoram as capas, as notas do encarte, e mesmo os miolos do vinil como seu devorassem a música também. Acho que esse lado da coisa não vai desaparecer - basicamente, as pessoas querem baixar música barata e colocar nos seus iPods e muitos deles não estão preocupadas com a embalagem. O que, no meu modo quadrado e fora de moda de ver as coisas, é uma vergonha.

Como vê hoje as mudanças do mundo da música, os processos eletrônicos. E o que achou da estratégia de lançamento do disco In Rainbows do Radiohead (lançado na internet e cujo preço é determinado pelo comprador)?

Quanto mais ferramentas para fazer música, mais jeitos de as pessoas terem acesso, melhor. A experiência com websites e o marketing direto aos fãs sem a intervenção de uma companhia de discos, como os Arctic Monkeys fizeram em seu primeiro disco, me lembra o punk rock nos anos 1970, quando eclodiram vários selos pequenos, independentes. Toda a ética do 'faça você mesmo' é incrivelmente excitante. A decisão do Radiohead de deixar as pessoas pagarem quanto quiserem pelo disco deles soa para mim como uma idéia original numa indústria em que idéias originais estão a milhas de distância (e é um disco muito, muito bom, por sinal). Não funcionaria com qualquer banda, especialmente as que estão começando, mas para um grupo estabelecido como o Radiohead - para quem o dinheiro não é realmente uma preocupação - acho que é um passo interessante e criativo. Por sinal, a banda inglesa The Charlatans decidiu fazer exatamente a mesma coisa, mas eles tiveram a má sorte de anunciar seus planos apenas algumas horas antes do Radiohead, e o Radiohead atraiu toda a atenção.

Você acha que os músicos mais modernos, hoje em dia, devem soar como se pertencessem a todo lugar e a nenhum ao mesmo tempo?

Pessoalmente, eu não quero perder minhas origens. Quero sempre saber de onde vim, porque é uma parte importante do que sou, algo que carregarei por toda minha vida. Acredito na preservação da identidade musical das diferentes culturas, e não gosto de música que abandona completamente suas raízes. Acho que é possível para um artista moderno falar para pessoas no mundo todo sem perder o contato com suas raízes.

Por que não tem jornalista sul-americano entre os críticos de sua lista?

Não há uma razão específica - é só a questão do que pudemos contatar naquele momento, e aqueles que puderam dar o retorno para a gente de que estavam disponíveis e interessados. Eu procurei contar com um amplo espectro de escritores, e conseguimos envolver jornalistas de toda a Europa até a África do Sul e a Austrália.

Surpreendentemente, há um número muito expressivo de músicos brasileiros no seu livro: Caetano Veloso, Tom Jobim, Maria Bethânia, Bebel Gilberto, Gilberto Gil, Carlinhos Brown, Mutantes. Todos são de uma corrente aqui batizada de MPB. Não há quase rock. Você conhece Raul Seixas, um pioneiro do rock no Brasil?

Bem, é verdade que a maior parte dos artistas brasileiros apresentada é da MPB. Temos Os Mutantes lá também, e você vai achar dois discos do Sepultura, cujo rock soa poderoso. Mas estou sempre procurando achar mais sobre música de fora da Inglaterra e Estados Unidos e a música brasileira é uma que quero saber mais a respeito. Agora, você me indica um nome novo. Eu vou procurar saber mais sobre Raul Seixas. Devo dizer que gosto muito do disco de estréia de Os Mutantes - tão jovem, tantas idéias, tanta energia.

Você já está planejando um novo volume para um futuro próximo? Com o mesmo número cabalístico, 1001?

Sim, vai sair uma edição revisada no ano que vem. Vamos tirar alguns álbuns que achamos que não resistem ao teste do tempo, e vamos trocar por alguns que achamos mais vigorosos. E permanecerá o número cabalístico: 1001.


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Um comentário:

Anônimo disse...

Cara, comprei esse livro no mÊs passado Muito bom!!!
Todo fã de música deve ter!!!!!!