Cansei de Ser Sexy - 6 Canções

A casa era, como o nome - Blackbox, em inglês - deixava claro, uma caixa preta. Lotada. No meio do cubo, sem palco, em visível desordem e misturando-se à platéia, várias meninas de guitarras em punho, um mini teclado fuleiro e um único homem, na bateria, pareciam passar o som. O volume alto realçava o caos.
Quando, depois de uns quinze minutos de punk rock barulhento, uma das meninas pediu para o baterista afinar sua guitarra, enquanto a japonesa de cabelos brancos que se destacava ao microfone parecia combinar algo com o resto da banda, me dei conta: o show já havia começado. Tão urgente que era difícil saber quando uma música começava ou acabava. Aquela explosão de espontaneidade e diversão borbulhante me deu plena certeza de estar assistindo à banda de rock brasileira mais coerente e representativa daquele início de século.
Poucos dias antes, aparecera no Tramavirtual o nome Cansei de Ser Sexy com uma música absurdamente crua chamada Ódio, Ódio, Ódio, Sorry C. Tão crua e direta, foi imediatamente parar nos destaques. Logo descobri que o lendário guitarrista do Butchers Orchestra Adriano Cintra estava envolvido e que as meninas eram ligadas à moda, às artes plásticas, design e cinema. Fazia sentido mas não garantia nada. A foto postada na página do Tramavirtual, que está lá até hoje, sim. Nada de rostos, além de sorrisos. Mais shortinhos e camisetas detonadas emoldurando pernas lascadas e sujas. Descompromisso total. Idêntico ao som.
Migrar dali para os fotologs - o de Lovefoxx chegou a ser o mais acessado do planeta - utilizados como nome das integrantes no Tramavirtual foi definitivamente revelador. Estava diante de algo verdadeiramente novo. Não apenas música, mas uma nova maneira de conviver com ela. Um jeito de se expor em meio ao processo. Um grupo inacabado que, ao contrário de preservar-se até chegar “ao ponto”, entregava-se corajosamente transformando tudo em estilo. Existe algo que faça mais sentido nesses tempos de telhados de vidro?
A identificação com o Tramavirtual estava estabelecida. Tanto que a Cansei de Ser Sexy marcou presença no Top 10 do site música após música e, em contrapartida, encontrou ali uma ferramenta poderosa que fez suas canções serem entoadas pela platéia em shows em qualquer parte do Brasil, sem ao menos um CD demo.
A determinação em montar uma banda para se divertir que a baixista Ira (então do punk rocker Hugh Grants) usou para convencer a amiga Maria Helena, que tinha um tecladinho e arriscava uma ou duas notas nele, logo estendeu-se por emails e encontros no então QG Torre do Doutor Zero, na Vila Madalena, em São Paulo. Lá, ao lado das futuras guitarristas Ana e Luiza Sá, já incorporadas ao time, requisitaram a presença de Lovefoxxx e de Adriano Cintra que tocava, entre tantos grupos, no fuleiríssimo I Love Miami, que as inspirou. Ele disse que aceitava o convite se fosse para tocar algo que nunca tinha tocado: bateria.
Já Lovefoxxx, que entrara para ser a portadora de mais uma guitarra, esqueceu de levar a mesma no primeiro ensaio da banda e acabou tendo de divertir-se berrando no microfone. Bem ao estilo Cansei de Ser Sexy, estava fundada a banda. Tão livre e desprendida que chegou a ter integrantes que simplesmente apareceram para assistir um ensaio e ficaram por um tempo na formação, como o caso da ex-vocalista Clara.
Adriano botou a obra pra andar, gravando as experiências nos ensaios semanais e bases eletrônicas em seu estúdio caseiro, enquanto Lovefoxxx fornecia as letras por email. Levando o fato de não saberem tocar seus intrumentos apenas como um desafio para a criatividade, o grupo começou a arriscar pequenos shows nas casas noturnas que alimentam o underground paulistano.
Cada noitada dessas vira uma aventura. Tudo pode acontecer: guerra de bolinhas de plástico entre banda e platéia, mergulhos do palco sobre as cabeças do público, calcinhas à mostra, cuecas jogadas ao palco (e devolvidas), gente tocando de costas o show inteiro e até gente tocando sentada no chão numa postura anti-espetáculo rara. Desprendimento que criou forte identificação dos que se apinham para vê-las em lugares pequenos, mal iluminados e com som alto e distorcido (yeah!) em celebrações caóticas e divertidíssimas.
Mas não é por respirar independência e autonomia 24 horas por dia que furtariam-se ao desafio de, convidadas para tocar entre Kraftwerk e 2 Many DJs, encarar o palco gigantesco do Tim Festival 2004 e sua platéia exigente. Para melhor enfrentar a empreitada convidaram a guitarrista Carol, que já tocava com Adriano na Verafisher. Para quem assumidamente não sabia tocar e nunca tinha se apresentado com uma distância de mais de cinquenta centímetros entre as integrantes da banda uma ousadia e tanto.
Sem abandonar os pequenos palcos, a formação expandida começou a depurar os arranjos e caminhar naturalmente para gravações que, mesmo que ainda caseiras, mirassem numa direção mais elaborada. Ou seja, como que se dizia antigamente “para virar disco”.
Mesmo crescimento teve o Tramavirtual neste período, de um site experimental à principal referência em música independente brasileira na internet com 50 mil músicas e quase 20 mil artistas. Hora do passo adiante. Mas não poderia ser repetido aqui nada do que já havia sido estabelecido nas relações entre artistas e gravadoras, do contrato ao marketing pé no chão, passando pelo formato. Um CD normal não é exatamente o que se espera de uma parceria dessas.
As gravações no software Logic (“eu odeio ProTools”, diz Adriano sobre o mais sofisticado e profissional programa de gravação digital) foram adicionadas de takes de bateria gravados no lendário estúdio de Clayton, baterista dos Detetives, por onde passam muitas das melhores bandas de rock independente de SP. Depois de acabamento caprichado em mixagem no estúdio da Trama, as 21 faixas viraram não um, mas dois discos. CSS SUXXX, um EP de sete faixas, foi concebido especialmente para venda exclusiva em shows, num envelope simples e preço acessível. Já o CD, propriamente dito, ganha tratamento especial, com luva e um CDR, grátis e personalizado, para incentivar o intercâmbio de cultura musical entre amigos, tão combatido pelas grandes gravadoras. O mesmo disco ainda deverá sair numa edição simples, atendendo aos diferentes perfis de fãs de música.
Enquanto isso, a Cansei de Ser Sexy recebeu no Brasil a visita do jornalista Peter Culshaw, do jornal britânico The Observer, que as destacou pela “sensibilidade pop e pelo comportamento subversivo” considerando que poderiam vir a ser “a maior banda a surgir na América Latina”e contando que ouviu da boca de Malcolm McLaren (ninguém menos que o cara que descobriu New York Dolls e Sex Pistols) que tem potencial de se tornar sucesso mundial.
Também viram sua Meeting Paris Hilton transformar-se em trilha para as chamadas do seriado da “homenageada” no canal de TV paga Fox e viraram personagens do jogo The Sims. Sem contar que tiveram sua música Computer Heat incluída na trilha, em Simlish, língua bizarra do game que substitui o inglês predominante nas letras da CSS. Opção feita meio ao acaso, já que começaram em português e, possivelmente pelo cotidiano conectado, foram adotando o idioma estrangeiro através das letras de Lovefoxxx. Sem conceitos ou preconceitos, naturalmente assim.
E o(s) disco(s)? Sou suspeito para falar qualquer coisa. Posso dizer que, conhecendo a Cansei de Ser Sexy muito bem, fui surpreendido faixa a faixa; que alguma composições aparecem tanto no EP quanto no LP (pode chamar assim?), em versões bem diferentes entre si; e que espero que todos se divirtam muito, como eu me diverti na primeira vez (e em todas mais) que ouvi essas canções bem alto.
(Carlos Eduardo Miranda)

1. Fuck Off Is Not The Only Thing You Have To Show
2. Let's Make Love and Listen to Death
3. I Wanna be Your J-Lo
4. Meeting Paris Hilton
5. This Month Day 10
6. Off The Hook

CSS SUXXX (EP)
1. Art Bitch
2. Bezzi
3. Fuck off is not the only thing you have to show (demo)
4. Meeting Paris Hilton
5. Ódio ódio ódio, sorry c.
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