Mombojó - Nadadenovo (2004)

Em minhas indagações particulares, sempre fiz algumas associações bobas, do tipo: Paulinho da Viola é o Neil Young brasileiro, assim como Chico Buarque seria o Bob Dylan, etc. Não que estas comparações tolinhas tenham qualquer fundamento na música, já que não pode existir nada tão distante quanto o samba de Paulinho e o rock de Neil Young. Pois bem. Seguindo esta mesma linha (a comparação é fundamentada, sim, no posicionamento do artista em relação à música do seu país de origem), sempre considerei o Mundo Livre SA como o Radiohead brasileiro. Comprando o disco do Mombojó através da revista Outracoisa, porém, mudei de opinião. O Mundo Livre pode até continuar sendo o Radiohead da fase OK Computer. Kid A para frente, entretanto, agora está ao encargo desta nova ave de rapina da tão fértil ninhada recifense.
“Nadadenovo” é um disco encantador. A vanguarda, a mistura de ritmos, a busca insistente por novos padrões sonoros, exatamente como encontramos em todos os discos da banda de Thom Yorke, se revelam aqui com uma autonomia dificilmente vista em álbuns de estréia. São flautas, escaletas, teclados de todos os tipos, scratches, sintetizadores, tudo confluindo num som sem retorno, que se desenvolve até onde a música deseja chegar: o Mombojó respeita a vontade de sua música. Não existem refrões, as soluções apresentadas aos conflitos musicais não são nem fáceis nem imediatas. Seria um disco de rock progressivo, se isso não fosse xingamento hoje em dia. Por isso mesmo, repetindo a façanha dos irmãos do Mundo Livre em seu último disco, “Nadadenovo” não é nada fácil. Depois de uma ou duas audições, a sensação de que nada se absorveu diante de tamanha complexidade pode vir à tona. Não se preocupe. Ouça mais vezes, e deixe a música fluir, que é esse mesmo o objetivo de um disco como esse. “Nadadenovo” nasceu para não ser fácil.
Voltando-me agora para uma análise mais categórica, o Mombojó mistura, em sua deliciosa salada, música brasileira (bossa nova, samba-canção, samba esquema novo), trip hop (Morcheeba, Portishead, Moloko), dub... e rock and roll, é claro. Não são todas as músicas que confirmam o padrão de engenhosidade do disco, é claro. Mas as boas compensam as faixas transitórias. “Deixe-se acreditar” abre com um palavreado de surf music e se complementa com guitarras sonicyouthianas, para depois vir em voz e flauta, sempre em progressão, ao som de teclados oníricos. A música é um sonho. “Esse é o reino da alegria / Nada pode acontecer, não tema”, canta o vocalista Felipe. Já “Discurso burocrático” se aprofunda no trip-hop; é quase um rap – como não se vê em praias brasileiras. “O céu, o sol e o mar”, talvez a melhor faixa do disco, se inicia com um reggae carregado e depois se desenvolve até um quase-refrão cheio de melodia, desaguando num inspirado solo de guitarra. É tocante. “Adelaide” encarna a porção sixties-jovemguarda. Lembra Cardigans só que – e isso é ducaralho – melhor.
Nem todo o “Nadadenovo” tem o padrão das músicas elogiadas acima, mas isso não faz grande diferença. As faixas mais dispensáveis, menos salgadas e com arranjos menos inspirados (como “Nem parece” ou “merda”) servem como pontes para os belos e complexos números principais. O disco é uma música só, e se mantém firme até o fim, como comprovam músicas que reabilitam Cartola (“Splash shine”) e Jorge Ben (“Faaca”). Não sei se ainda existe aquilo que antes chamavam de manguebit, mas existindo ou não, está aí diante de nós o seu terceiro vértice. É um acontecimento para o rock brasileiro. (Ciro I. Marcondes)

1. Cabidela
2. Deixe-se acreditar
3. Nem parece
4. Discurso burocrático
5. A missa
6. Absorva
7. O céu, o sol e o mar
8. Adelaide
9. Duas cores
10. Estático
11. Merda
12. Splash shine
13. Faaca
14. Baú
15. Container

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Bonus:
Ela voltou diferente (Odair José) (Faixa da coletânea-homenagem a Odair José "Eu vou tirar você desse lugar")


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